quinta-feira, 23 de maio de 2013

Sua adubação é competitiva?


(Artigo assinado pelo pesquisador Álvaro Vilela de Resende, da Embrapa Milho e Sorgo)

Por envolver mais de 30% do custo de produção e ser um dos principais condicionantes da produtividade, o gerenciamento do fornecimento de nutrientes é um componente do sistema de cultivo que pode impactar substancialmente a rentabilidade das lavouras. Um aspecto intrigante na moderna agricultura do Brasil é o fato de a maioria dos produtores de grãos não ter uma dimensão mais exata de quanto seria a dosagem de adubos apropriada aos diferentes ambientes de produção constituídos pelos talhões da propriedade. Embora todo produtor identifique variações de produtividade conforme o talhão, a cultivar, as condições climáticas e as práticas culturais, poucos consideram essa informação como critério para a tomada de decisão na hora de planejar o uso de fertilizantes para a safra vindoura. O resultado dessa atitude costuma ser a aplicação de doses fixas dos mesmos fertilizantes a cada safra, sucessivamente. Assim, parece não ser claro, para muitos agricultores, o papel de uma adubação mais eficiente para a competitividade na produção de grãos.

A expansão do plantio direto levou a um maior tamponamento dos ambientes de cultivo e tornou mais complexo o diagnóstico do status de fertilidade do solo, de modo que num primeiro momento o desempenho das culturas pode não refletir, de forma visível, eventuais mudanças no manejo da adubação. Nessas condições, os benefícios de um dimensionamento mais criterioso do aporte de nutrientes não são sentidos imediatamente, mas poderão aparecer em médio ou longo prazo, influenciando a eficiência econômica do sistema de produção.
Duas situações têm se tornado comuns nas regiões agrícolas do País: a primeira diz respeito ao agricultor que acha que aumentar as doses dos fertilizantes que está acostumado a usar é sempre garantia de colheitas crescentes, enquanto a segunda refere-se ao produtor que se acomodou e usa sempre a mesma adubação, apesar de investir em sementes e tratos culturais mais modernos, que geram novos patamares de produtividade. A eficiência no uso de fertilizantes pode ser baixa nos dois casos. O agricultor que exagera na adubação costuma ter um solo "saturado" de nutrientes, em que as aplicações adicionais não correspondem a ganhos de produtividade economicamente compensadores, além de aumentar a chance de perdas e desequilíbrios nutricionais. Por outro lado, o agricultor que investe em novas tecnologias mas não atualiza sua adubação acaba comprometendo as reservas de nutrientes do solo, prejudicando a quantidade e a qualidade da matéria orgânica no plantio direto, além de não potencializar a renda que poderia usufruir de outras tecnologias, como, por exemplo, da utilização de cultivares de alto potencial genético.

Num cenário em que os preços de venda de grãos commodities recebem forte influência do exterior e os preços de compra de fertilizantes sofrem também uma pressão de demanda interna, com difícil previsão de comportamento do mercado, a economicidade das adubações deve ser posta em cheque constantemente. Para ser eficiente, o produtor não pode fechar os olhos e fazer adubações grosseiras. Conhecer mais a fundo as características do seu sistema de cultivo, que afetam a nutrição das lavouras, e se cercar do apoio de profissionais bem informados ao especificar e dimensionar a adubação podem representar o diferencial na busca de produtividade eficiente. Embora possa parecer óbvio, enfatizamos os termos "especificar e dimensionar a adubação", pois os nutrientes não são apenas o N, P e K, mas N, P, K, Ca, Mg, S, B, Cu, Fe, Mn, Mo, Zn..., cujas proporções disponíveis no solo oscilam ao longo das safras e o desequilíbrio de um compromete a eficiência dos demais. Portanto, uma adubação bem definida em termos qualitativos e quantitativos é um pré-requisito tão mais importante quanto mais intensivo o sistema de culturas adotado e quanto maiores as produtividades alcançadas.
A visão de adubação do sistema e não de uma safra/cultura isoladamente tem se mostrado um aspecto preponderante para o bom planejamento do manejo nutricional das lavouras. O padrão de alternância das culturas e as produtividades obtidas têm implicações nos estoques e na ciclagem de nutrientes no ambiente de produção. Sabe-se, por exemplo, que o milho cultivado após soja beneficia-se largamente do nitrogênio fixado pela leguminosa e liberado com a decomposição dos restos culturais. Baixas doses na adubação nitrogenada para o milho de segunda safra em sucessão à soja são suficientes para atender a demanda frente ao potencial produtivo nessa época de cultivo. Por outro lado, no milho de primeira safra rotacionado com soja, a adubação nitrogenada para cultivares de alta produtividade precisa ser reforçada, visto que o estoque do sistema (solo + palhadas) poderá contribuir com apenas parte da extração total do nutriente pelo milho nessas condições. Uma adubação deficitária penalizará a qualidade do plantio direto com um balanço negativo de N no sistema, num processo que, se continuado, irá depauperar o que demorou anos para ser construído.

No caso do fósforo, tem-se verificado uma tendência de acúmulo nos solos ao longo do tempo, principalmente nos mais argilosos, elevando bastante a fertilidade. Esse processo de enriquecimento do solo, associado à maior eficiência no aproveitamento dos nutrientes proporcionada pelo sistema plantio direto, faz com que não ocorram ganhos significativos de produtividade com adubações fosfatadas pesadas. Por isso, deve ser revisto o uso contínuo de fórmulas carregadas em P, que foi uma prática recomendada no passado para a abertura de áreas agrícolas, mas que pode ser anti-econômica em solos de fertilidade construída cultivados e adubados há muitos anos.

Em se tratando do potássio, é preciso atentar para a exportação relativamente maior pela soja em comparação ao milho, o qual acumula uma grande proporção do nutriente nas partes vegetativas que irão compor a palhada e sofrerão ciclagem após a colheita dos grãos. De qualquer modo, sistemas de produção mais intensivos requerem um grande fluxo de K para atender a demanda de extração pelo milho e pela soja de alta produtividade, o que implica na necessidade de maior quantidade do nutriente na adubação.

Percebe-se com esses comentários envolvendo N, P e K que, a partir de certo nível tecnológico, é oportuno procurar quantificar de forma mais precisa as entradas e saídas para se aprimorar a adubação de cada talhão, o que obviamente também vale para todos os demais nutrientes. Informações relativas às quantidades extraídas, exportadas e cicladas são fundamentais para se identificar a demanda de cada nutriente, confrontar com o diagnóstico de análises de solo e foliares, estimar os créditos existentes no sistema e chegar à necessidade de aplicação via fertilizante. Os ajustes serão mais confiáveis quando se dispuser de tais informações atualizadas e aferidas localmente, o que exige monitoramento mais freqüuente dos talhões.

Alguns desses aspectos são detalhados na Circular Técnica 181 da Embrapa Milho e Sorgo, disponibilizada em dezembro de 2012 (http://is.gd/vwi9Hb), que apresenta uma abordagem voltada para o manejo da adubação NPK em sistemas de cultivo de milho visando alta produtividade na região do Brasil central. A publicação traz reflexões sobre a dinâmica desses nutrientes no sistema plantio direto, estimativas de extração e exportação, além da sugestão de critérios para refinar o cálculo das adubações.

Na interação da pesquisa com o produtor, observam-se com freqüuência oportunidades de melhoria do manejo da fertilidade do solo que poderiam se refletir em maior competitividade para o sistema de produção conduzido na fazenda. A constatação mais comum é a aplicação desproporcional de nutrientes. Há casos em que o ajuste na aplicação de um único nutriente pode aumentar o retorno do investimento em outras tecnologias (sementes, defensivos, máquinas, irrigação). Há também situações em que é possível estabelecer uma estratégia variável na aquisição de fertilizantes, utilizando-se das reservas do solo nos momentos de alta dos preços dos nutrientes e recompondo-as quando os preços forem mais favoráveis.

Com a evolução dos sistemas de produção de grãos, justificam-se os esforços em informar, atualizar e conscientizar os profissionais de assistência técnica, agentes públicos e consultores privados, sobre as modificações na relação solo-nutriente-planta e as possibilidades de avanços gerenciais requeridos na agricultura moderna. O agricultor, como cliente das tecnologias, precisa conhecer e demandar tais avanços. Vale relembrar que também na fertilidade do solo a eficiência econômica deve ser o primeiro ponto a se observar quando se fala em produção sustentável, na plenitude do conceito (sustentabilidade econômica, ambiental, social, ética...).

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